Desde há quatro anos que Ricardo Martins distribui comida a crianças carenciadas, na Venezuela, no âmbito de ações de solidariedade que diz procurarem retribuir o acolhimento dado aos portugueses que emigraram.
Sem apoio estatal, mas contando com “o bom coração” de pessoas que o ajudam desde o estrangeiro, através da plataforma ‘GoFundMe’, há um ano que constrói uma cantina para atender gratuitamente a uma centena de crianças em Cáugua, no estado venezuelano de Arágua (100 quilómetros a oeste de Caracas).
“Este projeto [distribuição de comida] começou há quatro anos, quanto estive em Portugal, trabalhando num restaurante. Ao ver tanta comida que deitavam no lixo, prometi-me que quando regressasse à Venezuela ajudaria as pessoas”, disse Ricardo Martins.
O português falava à Lusa, em Turmero (estado de Arágua), onde distribui comida a crianças e anciões, na cantina do Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.
“Eu já tenho quatro anos fazendo isto. Começámos preparando comida e a dando às pessoas na rua, pouco a pouco cada vez mais pessoas me ajudam e isto tem ido crescendo. Entregamos quase 300 comidas às sextas-feiras, mas durante a semana ajudamos muitas pessoas com medicamentos, operações, cadeiras de rodas”, contou.
Natural de Lisboa e emigrado há 41 anos na Venezuela, Martins explicou que na rede social Instagram (ricardo.martins58) é possível ver algumas das ações que realiza. Também recebe apoio de cidadãos dos Estados Unidos da América (EUA) e alguns da Europa, mas salientou que através da ‘GoFundMe’, podem ajudar “de qualquer parte do mundo”.
“Há milhares de pessoas que precisam de ajuda. A mim me escrevem diariamente, pedindo ajuda, muitas vezes em medicamentos que trazemos da Europa e dos EUA. Às pessoas que precisam e têm a receita [médica], nós entregamos os medicamentos”, acrescentou.
A sul de Turmero, em Cáugua, do outro lado da autoestrada, Ricardo Martins referiu que decorrem as obras do seu novo sonho, “conseguir construir uma cantina para crianças de baixos recursos na Venezuela”.
“Isto será uma cantina infantil. Começaremos com 100 garotos [crianças]. Vamos ter serviço médico e odontológico. Não haverá que pagar nada e é para todas as pessoas que precisem. Isto, é um sonho. Isto era uma casa velha onde já trabalhamos há um ano, com a ajuda das pessoas de bom coração e a ajuda de Deus também”, adiantou.
Por outro lado, declarou que “há muitos portugueses passando dificuldades na Venezuela”, mas que desde que começou com as ações de apoio apenas ajudou dois compatriotas, um homem e uma mulher.
“O Governo português deveria ajudar-me, porque a Venezuela deu tanto aos nossos pais, aos nossos avós, irmãos e amigos. Eu acho que este é o momento para ajudar a Venezuela, aos venezuelanos que nos deram tanto. É a melhor forma de retribuir o nosso agradecimento ao povo venezuelano e a este bonito país que nos tem dado tanto”, desabafou.
Ricardo Martins dedica 18 das 24 horas de cada dia às ações de solidariedade, mas, tal como muitas pessoas que fugiram da crise que afeta o país, tentou sorte em Portugal (há pouco mais de quatro anos) e nos Estados Unidos.
“Tive que sair, como muitos venezuelanos, a trabalhar noutros países para manter a minha casa e também ajudar a fazer isto. Muitos amigos perguntam-me porque não fico lá fora [no estrangeiro], mas o que sinto pela Venezuela é amor e sempre quero voltar, estar aqui, que isto seja um país cada vez melhor”, disse.
Questionado sobre se já tinha recebido ajuda do Governo venezuelano Martins respondeu que “não”, mas que também nunca pediu, justificando: “O meu trabalho é mais com pessoas do que com o Governo, são as pessoas que me ajudam a continuar com isto”.