Aqueles que têm paciência de ir lendo o que escrevo, nesta coluna que o JM gentilmente me cedeu, sabem que o meu tema de eleição são as migrações. Claro que por defeito profissional, mas também porque as questões éticas inerentes sempre me interessaram. Todavia, a razão essencial é a paixão que dedico à temática. Reconheço que foi um gosto adquirido, que teve a sua origem nas inúmeras histórias que fui ouvindo. Histórias de pessoas, de gente real, com rosto, com nome, com passado. Foram histórias sobre partidas e chegadas; sobre saudade e amor; sobre fé e engano. Histórias de sucessos e fracassos, de êxitos e desilusões. Mas como foram histórias contadas na primeira pessoa, ou histórias de familiares próximos, foi sendo fácil identificar-me com elas, despertando em mim esta paixão.
Ora, para o último artigo de opinião do ano, não poderia deixar de falar neste tema.
As migrações são uma característica da humanidade desde o seu berço. Garantiram-nos a diversidade genética fundamental à nossa sobrevivência enquanto espécie. Os movimentos migratórios têm sido também factores decisivos para o nascimento e desenvolvimento das civilizações. E nem precisamos de recuar muito: basta olharmos para o exemplo dos EUA, do Canadá ou da Austrália para percebermos a importância das migrações e os benefícios que trazem para a humanidade.
A Madeira sempre conviveu com esta realidade. Porto central entre a Europa e o Mundo, assistiu a muitas partidas e muitas chegadas.
O movimento mais acentuado sempre foi, todavia, o de saída: apesar da ilha idílica, as condições de vida nunca foram fáceis para os que ficaram por cá: a orografia difícil ou a ausência de escala para uma economia pujante não facilitaram a vida aos madeirenses e por isso muitos tiveram de emigrar, à procura de condições mínimas de subsistência.
Vivemos, contudo, num período diferente: temos assistido a um crescimento do movimento imigratório para o qual devemos olhar como uma oportunidade e não como um constrangimento. A estatística não está feita, mas não errarei muito se disser que cerca de 20.000 não naturais da Madeira terão residido entre nós ao longo de 2019. Foram pessoas que procuraram a Madeira e para as quais temos obrigação de encontrar as políticas necessárias à sua correta e adequada integração.
O Papa Francisco dedicou este ano à temática das migrações e sobre elas disse algumas coisas essenciais. Disse-nos que no que respeita aos migrantes que chegam aos nossos países, às nossas cidades, às nossas comunidades, é essencial acolher, proteger, integrar e promover. Acolher, enquanto recepção das pessoas de braços abertos e com solidariedade, em espaços adequados. Como proteção entenda-se a garantia e respeito da sua dignidade e dos seus direitos inalienáveis enquanto pessoas humanas, bem como a defesa das suas liberdades fundamentais. A integração consiste no reconhecimento da riqueza cultural que nos trazem e na aceitação que a sua presença na nossa comunidade ajuda-a a desenvolver-se, não apenas socialmente e culturalmente, como também economicamente. E, por fim, a promoção do migrante, que passa por garantir o seu desenvolvimento integral e as condições para que possa ter sucesso e ser feliz neste seu novo lar, contribuindo também para o bem-estar da demais comunidade.
Ora, estes 4 passos que o Santo Padre nos exorta a dar, enquanto comunidades, ajudar-nos-ão a fugir do "pecado da indiferença" mas são essencialmente a garantia de que as migrações serão um factor de enriquecimento, desenvolvimento e coesão para a nossa terra.