No primeiro trimestre de 2018-2019, o ensino do português como língua estrangeira em Espanha chega a 50.889 estudantes, dos quais 22.500 estão no ensino superior.

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Estes números devem-se ao trabalho desenvolvido por Portugal, através do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua (Camões, I.P.) e da Coordenação do EPE em Espanha, e ao interesse das regiões autónomas espanholas pelo ensino desta língua de abrangência global. Nesta entrevista, a coordenadora do EPE (Ensino Português no Estrangeiro) em Espanha, Filipa Soares, revela algumas novidades do ensino do português no atual ano letivo...

Em 2017-2018, a CEPE celebrava um número de alunos até agora nunca alcançado: mais de 50 mil, nos níveis básico, secundário e superior. Esse número mantém-se neste ano letivo?
Sim, o número de alunos mantém-se no presente ano letivo, tivemos, inclusive, um ligeiro incremento. Segundo os indicadores relativos ao primeiro trimestre de 2018-2019, o ensino do português como língua estrangeira é frequentado por 50.889 alunos.

Que novidades traz o novo ano letivo em Espanha a nível dos ensinos básico e secundário?
A rede EPE Espanha mantém-se estável, com o mesmo número de cursos de português e o mesmo número de professores. A rede autonómica, isto é, a rede docente assegurada pelas comunidades autónomas espanholas está a aumentar. Este ano, pela primeira vez em muitos anos, as autonomias espanholas abriram concurso público com vagas específicas para professores de português, o que demonstra que as autoridades educativas estão mais sensíveis às necessidades reais das escolas e à procura crescente de alunos interessados em estudar português.
Para além da estabilização da rede EPE Espanha na área educativa a trabalhar em articulação com os professores espanhóis de português, a Coordenação de Ensino desenvolve um plano de ação de formação de professorado e um plano de ação cultural junto da comunidade escolar.
Acreditamos que um ensino de excelência passa pelo desenvolvimento de um programa de ação formativa contínuo, capaz de melhorar as competências e valências adquiridas durante o percurso universitário e, correlativamente, dar resposta às necessidades educativas atuais com que o professor de português se depara num contexto plurilingue, com diferentes níveis de proficiência linguística. É de salientar que as ações de formação por nós realizadas visam não só os docentes da rede EPE Espanha, mas também os professores de português das diferentes redes de ensino, sendo as mesmas certificadas pelas autoridades educativas autonómicas.
No presente ano letivo 2018-2019, já realizámos duas ações de formação, uma em Santiago de Compostela e outra no nosso CCP-Vigo, subordinadas ao tema ‘Os textos literários de língua portuguesa como ferramenta para o ensino da dimensão pluricultural da Língua Portuguesa’ e ‘A linguagem audiovisual como recurso didático em PLE’. Para 2019 está prevista a realização de sete ações de formação presenciais, a saber:
– ‘O ensino da(s) fonética(s) da língua portuguesa em PLE/PL2 no contexto educativo espanhol’; ‘Aqui há gato! Curso destinado a professores de PLE’, relativo à revisão de estruturas gramaticais, lexicais prosódicas que originam dúvidas em contextos linguísticos de proximidade; ‘Pragmática na sala de aula de PLE/PL2’; ‘Didatização de textos literários de língua portuguesa’; ‘Pensar na literatura em PLE’; ‘Aqui há gato 2! Curso destinado a professores de PLE’ e ‘Ensino e aprendizagem dos atos ilocutórios do português: formas de tratamento, pedidos de de desculpa, expressão de desejos e outros’.
Queremos relançar o projeto de assinatura de um Protocolo de Cooperação entre o Camões, I.P. e o Ministério da Educação, Cultura e Desporto espanhol na área da formação e certificação, por forma a aumentar a nossa área de abrangência e consolidar a imagem do Camões, I.P., como instituição de referência na área da formação docente e reconhecimento oficial em Espanha. As recentes mudanças de Governo em Espanha atrasaram a formalização desta iniciativa. Contudo, já estamos em negociação com os novos atores políticos e esperamos poder levar a cabo este projeto extremamente interessante para os docentes espanhóis de português. Por último, mas não menos importante, a Coordenação de Ensino desenvolve um plano de acão cultural junto da comunidade escolar que promociona e consolida a divulgação da língua portuguesa junto de alunos e de professores.


Espanha é o exemplo de um país onde cresce a procura pelo português integrado no currículo escolar. Esse crescimento é acompanhado também por uma procura dos exames de certificação?
A comunidade escolar começa a ser consciente da importância de certificar o nível de proficiência linguística dos aprendentes e constatamos essa realidade no nosso dia-a-dia com os pedidos de informação que chegam à Coordenação de Ensino. Hoje em dia os candidatos que realizam as provas de certificação em PLE têm uma idade superior a 17 anos. Contudo, várias escolas, designadamente, em Navarra e na Extremadura já manifestaram o seu interesse para realizar as provas de certificação das aprendizagens em português língua estrangeira, nos próprios centros educativos, a todos os alunos interessados em certificar o seu nível de conhecimento da língua, após a conclusão dos respetivos ciclos educativos.
Neste momento, estamos a analisar a possibilidade de começar um projeto piloto com Navarra para aplicação das provas de certificação e, paulatinamente, alargar esta oferta a todo o território nacional.

 

Em que regiões autónomas de Espanha se verificou o aumento do interesse? Estão em processo de negociação de memorandos com outras regiões autónomas?
Como referi anteriormente (e já afirmei noutras ocasiões), a assinatura dos memorandos de entendimento com as comunidades autónomas da Andaluzia, da Extremadura e da Galiza confirmaram quão importante foi a assinatura destes instrumentos bilaterais para a implementação e ou consolidação de políticas linguísticas no âmbito do ensino aprendizagem do português como língua estrangeira.
Mais recentemente, à margem da XXX Cimeira Luso-espanhola, assinámos um Memorando de Entendimento com Castela e Leão e constatámos um interesse crescente pela implementação do ensino do português em várias escolas daquela região, o que demonstra que este tipo de ação política tem repercussão direta no modo como se estruturam e perspectivam as necessidades educativas da comunidade escolar e, também, da comunidade civil.
Podemos afirmar que a assinatura dos memorandos contribuiu para a afirmação da língua portuguesa como património linguístico de 260 milhões de falantes e para as potencialidades da língua portuguesa como língua de comunicação universal, língua de cultura, língua de trabalho e língua de ciência capaz de gerar novas (e factíveis) oportunidades de emprego num mundo global.
Em relação à negociação de novos memorandos de entendimento, uma vez fechado o arco das Comunidades Autónomas de fronteira em matéria de ensino do português em Espanha, estamos em processo de negociação com o Principado das Astúrias. É ainda prematuro falarmos de datas de assinatura, pois ainda estamos numa fase de análise de propostas e contrapropostas.

 

A Coordenação também tem dinamizado cursos de Português para funcionários de empresas, de que é exemplo a Renfe. Essa oferta mantém-se? Foi ou será alargada?
A cooperação com a RENFE mantém-se e foi recentemente alargada. Candidatámo-nos a novo procedimento concursal e fomos selecionados. Penso tratar-se de um bom exemplo de cooperação interinstitucional e queremos alargá-la a outras instituições públicas e privadas mediante, sobretudo, a criação de programas formativos de ensino do português língua estrangeira na modalidade de ensino a distância, pensados, em particular, para hispano-falantes.

 

No ensino superior, o Português tem tido um aumento de procura?
A nível do ensino superior, o Camões, I.P. está presente em 14 instituições universitárias.
Dessas catorze, 10 correspondem a Protocolos de Cooperação com instituições de ensino superior que promovem o ensino da língua portuguesa em diferentes áreas do saber e quatro Protocolos de Cooperação para a criação de cátedras que asseguram a investigação e produção científica, o ensino e divulgação da língua e cultura portuguesas em variadíssimas áreas do conhecimento.
Em 2019 queremos formalizar a assinatura da criação de uma nova cátedra, a Cátedra Oliveira Martins, que desenvolverá estudos científicos nas seguintes áreas de investigação: Cultura e pensamento político; Poder e representação; Norma jurídica e direito público; Pensar Europa desde a Península Ibérica; Europa, referência cultural e política para os Estados peninsulares; Portugal e Espanha: cultura, cenários políticos e institucionais europeus; Europa e a Península Ibérica: novos protagonistas sociais e políticos. Esta cátedra estará sob direcção do Professor Hipólito de la Torre, catedrático de História Contemporânea da UNED (Universidade Nacional de Ensino à Distância), e um dos grandes conhecedores e investigadores em Espanha sobre História de Portugal contemporânea. Estamos convencidos que a ação desenvolvida pelos diferentes pontos focais do Camões, I.P, designadamente, o trabalho realizado pelos Centros de Língua Portuguesa adstritos às universidades, como ocorre com o CLP de Barcelona, Cáceres ou Madrid, as ações levadas a cabo pelo CCP-Vigo e o trabalho realizado quer pelas cátedras quer pelos docentes ao abrigo de Protocolos de Cooperação tem contribuído para o aumento da procura. No presente ano letivo, houve um ligeiro incremento do número de alunos em relação ao ano passado, estando a frequentar as aulas de PLE, 22.530 alunos, aproximadamente.

 

Qual é o perfil desses alunos?
O perfil dos alunos de português é variado e as razões pelas quais se aproximam à aprendizagem da língua é também ela diversa. Existem razões de índole afetiva, de mobilidade estudantil, de oportunidade laboral e de uma aparente facilidade na aquisição de uma língua próxima. Depois surge a descoberta por um país que os deslumbra pelo contacto com as pessoas, pelas paisagens, pelo património, pela gastronomia, pela música, pela sua cultura, pela sua literatura, entre outras razões. Acresce a consciencialização de que o português é uma língua universal, cuja dimensão representa um vetor de oportunidades excecionais num mundo global o que, por outro lado, motiva os docentes a melhorarem as suas competências linguísticas e o seu nível de conhecimento, conscientes do seu papel elementar na formação dos homens e mulheres de amanhã.

 

Em junho deste ano, o Camões, I.P. assinou com a Universidade de Sevilha um protocolo de cooperação para o ensino de português, ajudando a formar professores. Há contatos com outras universidades no ano letivo de 2018/2019?
A propósito da assinatura do Protocolo de Cooperação entre o Camões, I.P. e a Universidade de Sevilha referi em tempos que as universidades começavam a ser conscientes do crescimento exponencial do ensino do português em Espanha e também da importância da língua a nível global. Hoje em dia pede-se à universidade que estabeleça pontes entre o mundo académico e o mundo laboral e empresarial, por forma a limar o desfasamento existente entre ambas as realidades.
A língua portuguesa tem a capacidade de gerar emprego em diversas áreas, tem um valor patrimonial importantíssimo no mundo atual. Por conseguinte, a aprendizagem da língua deve ser entendida como uma mais-valia no processo formativo do aluno, proporcionando-lhe novas oportunidades laborais num mundo global. Por este motivo, temos alargado a nossa cooperação com as instituições de ensino superior, tornando-as partícipes do nosso projeto de ação formativa e colaborando interinstitucionalmente na organização de jornadas formativas em âmbitos específicos da didáctica da língua e da literatura, como já ocorre com a Universidade de Santiago de Compostela e a Universidade da Extemadura e, num futuro próximo, com a Universidade da Corunha.


Ação cultural consolida a aprendizagem do português
As atividades de índole cultural desenvolvidas pela Coordenação do EPE em Espanha são uma importante componente do plano de ensino da língua portuguesa naquele país, porque “promovem e consolidam a divulgação da língua portuguesa junto de alunos e de professores”, destaca Filipa Soares. “Acreditamos que a língua e a cultura são um binómio indissociável que contribui mormente para o fomento do multilinguismo, da descoberta do outro, alargando horizontes e contribuindo para o crescimento integral do indivíduo”, diz a coordenadora, acrescentando que a cultura “completa, aproxima e esvai certos atavismos que, por vezes, teimam em perseverar”. Numa outra ótica, a dinamização de um plano cultural a cada ano letivo faz aproximar a comunidade escolar à sociedade civil, já que as ações realizadas no âmbito escolar são abertas ao público em geral. Foi o caso dos ‘Encontros com a literatura: António Mota na Galiza’, ação realizada no Centro de Educação Infantil e Primária de A Mariñamansa que deverá vir a realizar-se fora do contexto escolar numa cerimónia aberta ao público em geral da cidade de Ourense”, revela.
Ana Grácio Pinto

In «Mundo Português»