Nicolás Maduro, que procura a reeleição nas presidenciais de maio, criou uma moeda digital para tentar sair da recessão.

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Na segunda-feira, Donald Trump assinou uma ordem executiva que proíbe as empresas e os cidadãos norte-americanos ou estrangeiros radicados no país de efetuarem transações em qualquer tipo de moeda digital emitida pelo seu homólogo venezuelano. Iniciativa que Caracas condenou "veementemente". A 20 de fevereiro, a Venezuela tornou-se o primeiro país a lançar a sua versão da bitcoin, uma iniciativa para tentar sair da recessão e permitir a emissão de dívida, proibida pelas sanções económicas norte-americanas. Na altura, as autoridades defenderam que o petro, o nome desta moeda digital, está sustentado nas reservas petrolíferas do país, as maiores do mundo, sendo portanto seguro para os investidores, mas os analistas recomendaram cautela.

Esta decisão de Maduro é reflexo da crise social que a Venezuela atravessa. Outro é a fuga de venezuelanos para países vizinhos como o Brasil e a Colômbia e que levou recentemente o alto-comissário da ONU para os Refugiados, Filippo Grandi, a apelar à América Latina para dar uma resposta a esta crise. Segundo dados do ACNUR, cerca de 133 mil venezuelanos procuraram refúgio noutros países entre 2014 e 2017, mas a estes juntam-se 363 mil que foram acolhidos através de outras "alternativas legais". O Brasil, por exemplo, decidiu acolher os imigrantes venezuelanos e facilitar documentação, acesso aos serviços públicos e mercado de trabalho.

Um estudo divulgado recentemente mostra que mais de metade dos venezuelanos vivem em pobreza extrema e afirmam ter perdido mais de dez quilos em 2017 - a pobreza extrema aumentou de 23,6 para 61,2% em quatro anos e quase 10% apenas entre 2016 e 2017. A título de exemplo, um hospital de Maturín, a sudeste de Caracas, revelou que nos primeiros dois meses do ano 18 crianças com menos de 4 anos já haviam morrido na instituição por desnutrição.

Os apagões elétricos são cada vez mais frequentes e, apesar de se sentirem principalmente no interior do país, também já chegaram a Caracas. Segundo o Comité de Afetados pelos Apagões, desde 1 de janeiro já foram registadas mais de 1980 ocorrências, 116 delas na capital. Algumas duraram 12 horas, mas há referências a apagões que se prolongaram por 72 horas.

Em termos políticos, a situação não está fácil para Nicolás Maduro, quer a nível interno quer externo. Há um mês, os EUA anunciaram o apoio à decisão do Peru de excluir o venezuelano da próxima Cimeira das Américas, marcada para 13 e 14 de abril, apesar de Maduro insistir que viajará para Lima. O Grupo de Lima (criado para tentar resolver a questão venezuelana e composto por 14 países, entre os quais Argentina, Brasil, Canadá, México e Colômbia) também se mostrou contra a presença de Maduro.

Depois de terem estado marcadas para 22 de abril, as presidenciais antecipadas foram adiadas para 20 de maio. As eleições na Venezuela normalmente acontecem em dezembro, mas foram inicialmente antecipadas para abril, o que foi considerado por alguns uma tentativa de apanhar a oposição desprevenida e facilitar a reeleição de Maduro. O presidente tem cinco adversários, sendo um deles Henri Falcon, militar reformado e dissidente do chavismo, que foi indicado pelo pequeno partido da oposição Avançada Progressista, contrariando a intenção de boicote da Mesa da Unidade Democrática, a coligação que faz a oposição formal.

As manifestações antigovernamentais são constantes, com especial destaque para as que ocorreram entre abril e julho do ano passado e que, segundo a Amnistia Internacional, resultaram em "pelo menos 120 mortos e mais de mil feridos". A AI, citando a ONG Foro Penal Venezuelano, revelou que durante os protestos foram detidas 5341 pessoas, das quais 822 foram julgadas. No final do ano, 216 continuavam detidas à espera de julgamento.

In «Diário de Notícias»