Portugal poderá invocar tratados antigos de comércio e circulação de pessoas com o Reino Unido após o Brexit para garantir a estabilidade da relação histórica entre os dois países, considera o advogado Jorge de Abreu.

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Diplomatas e membros do governo dos dois países referem frequentemente a vitalidade da mais antiga aliança no mundo, o Tratado de Windsor, formalizada em 1386 pelos reis João I, de Portugal, e Ricardo II, de Inglaterra, confirmando os termos do acordo assinado em 1373 entre Fernando, de Portugal, e Eduardo III, de Inglaterra.

Mas um estudo do advogado Jorge de Abreu identificou acordos que remontam ao século XII, como o Tratado de Alcácer do Sal de 1127 ou mesmo um pacto verbal feito em 1147 após o cerco e conquista de Lisboa.

Este oferecia, segundo a carta de um cruzado depositada na biblioteca do Corpus Christi College da Universidade de Cambridge, livre uso dos portos, prioridade nas pilhagens e na distribuição de terras.

Outros acordos subsequentes, como o Tratado de Methuen, de 1703, que facilitava a entrada do vinho português em território britânico, o Tratado de Aliança e Amizade de 1810, que abriu os portos do Império lusitano ao Reino Unido, e o Tratado de Navegação e Comércio de 1914, reforçaram os laços.

Neste último lê-se: "Deve haver entre os territórios das duas partes contratantes plena e completa liberdade de comércio e navegação. Os sujeitos ou cidadãos de cada uma das duas partes contratantes devem ter liberdade para vir com os seus navios e cargas para todos os lugares, portos e rios nos territórios do outro para os quais os sujeitos nativos ou os cidadãos são ou podem ser autorizados a vir".

O advogado considera este "um tratado curioso, porque praticamente estipula que não há barreiras quer do direito de livre de circulação de pessoas e de bens entre os dois países. Esse tratado, do meu ponto de vista, e já estudamos isso juridicamente, está em vigor e estabelece essa abertura e reconhecimento recíproco de direitos aos cidadãos e à livre circulação de mercadorias".

Jorge de Abreu revelou como foi esta interpretação que invocou, com sucesso, quando defendeu um cliente cuja propriedade no Alentejo foi ocupada após a revolução de 25 de abril de 1974.

"Nem foi preciso ir a tribunal", recordou, evitando dar mais pormenores sobre o processo.

O jurista admite que "a aplicação dos tratados bilaterais tem sempre de respeitar as regras europeias ", mas acrescenta: "Desde que seja uma abertura em termos de comércio livre, esses tratados estão em vigor e são invocáveis".

O advogado é o atual presidente da Câmara de Comércio Portuguesa no Reino Unido, que tem mantido neutralidade nas posições sobre o 'Brexit', mas julga que Portugal deve aproveitar a situação para renovar a aliança luso-britânica, numa altura em que as negociações entre Londres e Bruxelas continuam tensas e sem acordo à vista.

"Temos tratados bilaterais, temos a região franca da Madeira, o Registo Internacional de Navios, o Centro Internacional de Negócios, tudo isto aprovado pela UE. Aqui está a panóplia de oportunidades para o Reino Unido constituir plataformas de investimento em Portugal", enunciou, referindo ainda os regimes dos residentes não habituais.

"Portugal deve acima de tudo preferir a estabilidade com o seu parceiro histórico e com a UE, que muito tem ajudado o país", conclui Jorge de Abreu.

In «Revista Port»