Secretário de Estado das Comunidades fala numa "inquietação" dos portugueses "com o evoluir da situação política". Mas diz que a maioria só quer condições para trabalhar.
"Há uma inquietação na comunidade com o evoluir da situação política na Venezuela que tem levado os portugueses a procurarem ter os seus papéis de identidade em ordem", explica o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luis Carneiro, revelando um crescimento sustentado de atos consulares no Consulado-Geral de Portugal em Caracas - de 43 462 em 2010 para 96 784 em 2016. Contudo, o responsável quer "desfazer a ideia de que os portugueses têm vindo a sair em massa" do país, indicando que a maioria daqueles com que falou na sua visita à Venezuela só quer ter condições de segurança para trabalhar. Foi essa a mensagem que passou ontem à ministra dos Negócios Estrangeiros venezuelana, Delcy Rodríguez.
José Luis Carneiro saiu do encontro com o "compromisso de serem desenvolvidas uma série de iniciativas" conjuntas, como por exemplo uma reunião já hoje entre os ministérios do Interior e da Justiça com os empresários portugueses tendo em vista criar condições de segurança e confiança permitindo a reabertura dos seus estabelecimentos. Mas também ao nível do levantamento de obstáculos à produção (sem farinha as padarias não podem trabalhar) ou a continuação do diálogo em relação aos atrasos de pagamentos às empresas portuguesas.
"Foi uma reunião bastante positiva. Sublinhei as boas relações históricas entre Portugal e Venezuela, lembrei que os portugueses querem fazer deste país um país de presente e de futuro, querem continuar a investir, não têm interesse em estar envolvidos na disputa política e querem ter condições para trabalhar. Foi isso que eu transmiti e foi isso que as autoridades aceitaram", disse ao DN por telefone.
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A questão da segurança é a que mais tem sido apontada pelos portugueses que vivem na Venezuela e que o secretário de Estado encontrou na visita que hoje termina. Falando dos "assaltos organizados" que têm ocorrido em especial na região de Valência, José Luis Carneiro destaca contudo a "capacidade e coragem" dos portugueses que reabrem os estabelecimentos poucos dias após os ataques, querendo "retomar as suas vidas".
O responsável diz que apesar de todos os problemas a maioria dos portugueses com mais de 50 anos "têm vontade de ficar e de continuar a fazer da Venezuela o seu futuro". Contudo, reconhece, "os mais jovens e mais qualificados, como também aconteceu com o nosso país quando passámos por um momento de crise, procuram condições de empregabilidade nos países vizinhos, nos EUA, e também em Portugal, França e Espanha".
Segundo os dados de José Luis Carneiro , entre os primeiros quatro meses de 2015 e os mesmos quatro meses deste ano só houve mais 86 pedidos de nacionalidade (de 894 para 980). "O que se pode dizer, com rigor é que, a partir de 2010 foi havendo um crescimento sustentado do número de atos consulares", afirmou. "Há uma subida sustentada, como aconteceu em todo o mundo, onde temos vindo a subir a 10% ao ano. Aqui a média anual varia entre 15% e 20%", acrescenta, apontando para um aumento do número de pedidos e renovação de cartões de cidadão e indicando que as pessoas querem ter os papéis em dia.
Estão inscritos no consulados portugueses na Venezuela 180 mil pessoas, mas calcula-se que haja meio milhão de portugueses e lusodescendentes no país. A maioria (cerca de 80%) são originários da Região Autónoma da Madeira. O secretário regional dos Assuntos Parlamentares e Europeus, Sérgio Marques, que viaja com o secretário de Estado, dissera antes à agência Lusa que estima que entre três mil e quatro mil luso-venezuelanos já regressaram à Madeira. "Temos vindo a registar um número crescente de conterrâneos nossos que regressam da Venezuela, isso tem-se vindo a intensificar nas últimas semanas. É notório", disse.
Mas, acrescentou Sérgio Marques, esse regresso é temporário: "O desejo das pessoas que têm chegado à Madeira é que, uma vez alterada a situação de crise política, económica e social que se vive na Venezuela, possam ter condições para de novo retomar a normalidade das suas vidas". O governo regional já criou um gabinete de "apoio ao emigrante da Venezuela".
O secretário de Estado diz que o governo português está a trabalhar em cooperação com o governo regional para a identificação dos casos que carecem de um apoio social para "procurarmos ser solidários com os portugueses, independentemente de ser na Madeira ou noutra região do país, garantindo a todos os apoios de que carecem". Em relação à ajuda aos que continuam na Venezuela, falou num levantamento de casos de necessidade nas regiões mais recônditas do país, assim como o reforço do apoio financeiro às instituições luso-venezuelanas que desenvolvem projetos ligados ao apoio domiciliário.