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É já um cliché evocarmos a importância da participação cívica e política dos cidadãos, nomeadamente através daquela que é a sua mais poderosa ferramenta em democracia: o voto.

Sancho GG

Mas se muitos cidadãos põem em causa o valor do seu voto e a sua real relevância para a qualidade de vida e para o sucesso da governação, sabemos, por experiência própria, que ainda é mais difícil mobilizar a população para as eleições europeias.

As causas para os elevados níveis de abstenção serão muitas e variadas, algumas estruturais (como a distância dos polos de decisão e a máquina excessivamente burocrática), mas estou em crer que a grande maioria das causas são de natureza conjuntural. Quer isto dizer que as pessoas se sentem mais ou menos motivadas para votar de acordo com os diferentes contextos sociais, culturais, económicos e muito especialmente com as conjunturas concretas individuais, das regiões e dos países.

Há mais de 100 anos, Ortega Y Gasset, nas suas “Meditações do Quixote”, ensinou-nos que “eu sou eu e minha circunstância, e se não salvo a ela, não me salvo a mim”.

Sem retirar as responsabilidades (e são muitas!) às instituições e aos agentes políticos, a verdade é que os abstencionistas ainda não perceberam que que só se salvam (qualidade de vida que entendem ser seu direito) se salvarem as circunstâncias que os cercam. E nessas circunstâncias, a política assume uma relevância crucial.

São muitos os pensadores que colocam em evidência a crise dos estados-nação, argumentando – bem, a meu ver – que as nossas vidas são cada vez mais afetadas por decisões de caráter supranacional e regional, retirando espaço e influência ao que há no meio: os estados. Cumulativamente, parece-me desnecessário perorar sobre a influência, para as nossas realidades pessoais, regionais e nacionais, das decisões e das políticas emanadas a partir de Bruxelas. Daí a importância do voto dos cidadãos nestas eleições. Porque de facto as nossas vidas são profundamente influenciadas pela União Europeia. E se não decidimos nós, então, quem?

Mas se é difícil mobilizar os cidadãos que residem em território nacional, é ainda mais difícil fazê-lo para os que optaram por sair do seu país.

De acordo com dados da ONU, Portugal é um dos países com maior percentagem de emigrantes, estimando-se que cerca 22% da população portuguesa resida em países estrangeiros.

A grande maioria destas pessoas reside em países que integram União Europeia pelo que não deverão ser considerados, administrativamente, emigrantes, mas cidadãos deslocados. O que os habilita a votarem nos candidatos que se apresentam às eleições no seu país de origem ou a participar nas eleições no seu país de acolhimento e votar nos candidatos que se apresentam neste país. Quer isto dizer que podem optar por muito mais listas. O que, na minha opinião, retira ainda mais legitimidade e argumentação aos abstencionistas deslocados uma vez que podem votar em candidatos portugueses ou de uma outra nacionalidade. Se não se identificam e/ou não vêm qualidade nos candidatos portugueses, pois bem, que escolham os dos países de acolhimento. Se escolherem bem e votarem com acerto, estarão sempre a contribuir para a sua “salvação” e para a “salvação” de Portugal e da União Europeia.

Por outro lado, também me parece fundamental que as comunidades residentes em países extracomunitários participem nestas eleições – e podem fazê-lo! – uma vez que o projeto europeu e a direção que seguirá terá um impacto global. Não apenas devido à dimensão económica da UE, ou ao facto de – ainda – continuar a ser um farol da democracia, da liberdade e dos direitos humanos, mas também porque a segurança e o desenvolvimento económico de algumas dessas comunidades dependem da política externa da UE. As inquietações sobre o seu futuro e o futuro dessas comunidades apenas encontrarão respaldo na União Europeia.

Por tudo isto, é bom não esquecer o ensinamento de Ortega Y Gasset: para se salvar, terá sempre de salvar a sua circunstância. E para isso tem bom remédio: nestas eleições europeias, seja diferente e vote. Porque o seu voto também faz diferença!

Sancho Gomes

In «JM»