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Recentemente, tive a oportunidade de participar no programa “20 Anos para lá do Oceano”, emitido pelo canal naminhaterra.tv e que tinha como objetivo celebrar a Diáspora Madeirense.

EstarParaLaDoOceano

Ali tivemos um vislumbre do que são hoje os emigrantes madeirenses, bem como a diversidade de locais onde “estamos”. Tivemos intervenções em direto a partir de Singapura, Austrália, Brasil, África do Sul, Estados Unidos e Reino Unido. Mas poderíamos ter tido de muitos mais locais: das Antilhas, das Guianas, da nossa querida Venezuela, de diversas ilhas do grande mar das Caraíbas, do Havai, da China, do Japão, enfim... Porque a verdade é que hoje estamos espalhados literalmente pelos 4 cantos do Mundo. Nalguns casos, uma emigração mais antiga, com comunidades organizadas e integradas; noutros, migrações e mobilidades proporcionadas pelas dinâmicas decorrentes da Globalização. Em muitos destes novos destinos ainda não temos comunidades propriamente ditas, mas temos já um número de emigrantes qualificados, bem integrados, valorizados, de excelência profissional, que dignificam o nome da Madeira e sua história e tradição.

Ora, mas se hoje em dia “estamos” ainda em mais locais, certo é, também, que o perfil dos migrantes madeirenses se alterou substancialmente.

Parecendo uma redundância, temos que perceber que o emigrante é uma pessoa, que pertence a uma determinada sociedade. As sociedades evoluem, transformam-se de acordo com o progresso civilizacional, com as alterações ao nível da cultura, com o aumento das qualificações e das habilitações, com a mobilidade social e mesmo com o evoluir das necessidades sociais e dos direitos. Ora, como é evidente, o emigrante madeirense de hoje tem um perfil distinto do emigrante dos anos 60 ou 70, porque os cidadãos madeirenses são hoje diferentes do que eram há 20, 30 ou 40 anos.

Temos níveis de literacia e formação superiores, somos mais conscientes e exigentes ao nível dos nossos direitos e das nossas condições de conforto. A pessoa que emigra hoje é uma pessoa como nós e com estas mesmas exigências. Atualmente, os nossos migrantes não fogem da precariedade, da falta de condições de saúde, educação ou habitação. Não fogem da miséria. Hoje as pessoas emigram porque consideram que a condição de conforto que usufruem não é aquela a que julgam ter direito. E vão à procura de melhores condições.

Os emigrantes, porque melhor formados, também não aceitam qualquer tipo de condição que lhe seja imposta. Por outro lado, não vão em busca de fortuna, à procura do el-dourado. É, pelo menos, o que podemos inferir, quando nos apercebemos que as pessoas têm saído para países onde encontram trabalho mas menores oportunidades de enriquecimento acelerado, porquanto sociedades mais competitivas. Não temos dados rigorosos, mas estou certo de que a maior parte dos nossos emigrantes hoje vai para o Reino Unido e para outros países da União Europeia. À exceção dos PALOP, porque temos lá muitas empresas portuguesas, os emigrantes já não vão para África e aqueles que partem para a América do Sul levam já na sua bagagem a segurança de contratos de trabalho.

Não obstante, se as razões que levam à partida parecem diferentes daquelas que existiam noutras épocas, a verdade é que as dificuldades não são menores. É certo que a sociedade da comunicação nos aproximou a todos. Também é verdade que a quantidade e a facilidade de acesso a transportes aéreos permite uma ligação mais habitual à terra natal. Contudo, há dificuldades que se vão perpetuando: a saudade permanente daqueles que foram deixados para trás e dos locais de doce memória; a solidão, quando o emigrante parte sozinho, sem plataforma ou rede familiar ou de amizade que o possa acolher; as diferenças culturais, que as vezes se repercutem também nos horários, nos ritmos e nos processos laborais; a dificuldade de adaptação à nova língua; o clima; a dificuldade em encontrar trabalho de acordo com as qualificações e experiência profissional - bem como às expectativas criadas - sujeitando-se a empregos menos qualificados, o que pode diminuir a autoestima pessoal. Estas são dificuldades perenes que todos aqueles que saem da sua terra bem conhecem.

E é também por isso que nós, que optámos por ficar, devemos o nosso reconhecimento a quem parte. Porque partir nunca é fácil. Não o era há 500 anos; não o foi há 50 e não o é, certamente, nos dias que correm!

In «Jornal da Madeira»